Alerta foi feito pelo secretário do Conselho Municipal de Direito da Criança e do Adolescente, Marto Oliveira, durante o encontro nacional “O Impacto das Grandes Obras e a Violação de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes – Desafios para Prevenção da Violência Sexual”, em Porto Velho
Autor: Ana Aranda
O descompasso entre a implantação de grandes obras estruturantes, como é o caso do Complexo Madeira em Porto Velho, e a implementação dos programas de mitigação – que só são implantados depois do início dos trabalhos – potencializa os problemas sociais provocados pela chegada de grandes contingentes de trabalhadores, com o agravante de que estas obras são construídas em locais distantes de grandes centros econômicos, onde já há uma grande demanda por serviços básicos como saúde, educação e segurança, sendo que os moradores locais não possuem qualificação profissional para trabalhar nos empreendimentos. A soma de todos estes fatores provoca uma grande desagregação social, que atinge em cheio os segmentos mais vulneráveis da sociedade: as crianças e os adolescentes.
O tema acima está sendo discutido em Porto Velho durante o encontro nacional “O Impacto das Grandes Obras e a Violação de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes – Desafios para Prevenção da Violência Sexual”, iniciado nesta segunda-feira (22/8) na auditório de SENAC, na Capital, com a participação da ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário Nunes, e a secretária executiva do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual de Crianças e Adolescentes, Karina Figueiredo.
“Queremos firmar um pacto, fazer com que autoridades federais, estaduais e municipais se comprometam em defesa da infância e da juventude no nosso município”, afirma Denise Campos, do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual, que está promovendo o evento.
De acordo com o relatório da Plataforma Dhesca Brasil, em decorrência das obras das UHE de Santo Antônio e Jirau, em Porto Velho o número de crianças e adolescentes vítimas de abuso ou exploração sexual, no período de 2007 a 2010, cresceu 18%, o percentual de estupros subiu para 208% e houve um aumento de 44% no número de homicídios dolosos.
Segundo, ainda, o estudo do Dhesca Brasil, “apesar de não haver indicadores específicos sobre a exploração sexual de crianças e adolescentes nessa região, as comunidades percebem o aumento da prostituição, sendo que em dias em que ocorre o pagamento dos funcionários a ocorrência de prostituição, inclusive infantil, é ostensiva. Em Jirau, por exemplo, um dos prostíbulos, denominado Copo Sujo, tem acesso quase que direto ao canteiro de obras”.
“A concentração de 22 mil homens nos canteiros de obras provoca grandes tensões, que precisam ser canalizadas de alguma forma”, ressaltou o coordenador da ONG Childood Brasil, Itamar Batista, durante o encontro.
Os relacionamentos sexuais destes trabalhadores com crianças, adolescentes e mulheres adultas deixam os chamados filhos das obras – centenas de crianças que ficam para trás, quando os pais vão embora ao fim do empreendimento.
Epidemia
De acordo com o conselheiro e secretário do Conselho Municipal de Defesa da Criança e do Adolescente de Porto Velho, Marto Oliveira, “a exploração sexual de crianças e adolescentes na Capital já se tornou uma epidemia e a situação deverá ficar pior com a realização da Copa do Mundo em 2014, com jogos programados para Cuiabá, no Mato Grosso, e Manaus, no Amazonas. Pesquisa do Ministério da Justiça informa que Porto Velho e Guajará-Mirim são rotas do tráfico de mulheres e homens – crianças e adultos – para fins sexuais e este grande evento certamente vai intensificar a prática”, alerta.
Em contrapartida, lamenta Marto Oliveira, “os órgãos públicos não estão preparados para enfrentar esta situação, que exige medidas urgentes. Falta infraestrutura administrativa e formulação de políticas públicas para a contenção destes agravos e não há perspectivas de que sejam providenciados os investimentos necessários. Infelizmente, crianças e adolescentes nunca foram prioridades no Brasil”.
Pós-usina
O sociólogo e professor da Universidade Federal de Rondônia (Unir), Luís Novoa, considera que a situação social em Porto Velho poderá se agravar com o término antecipado das duas usinas, “cujas construtoras estão correndo contra o tempo para colocar as turbinas em funcionamento e terem direito a um bônus no preço da energia ofertada, sendo que nem 30% das condicionantes acertadas para a liberação da licença de instalação das obras foram plenamente atingidas, de acordo com o último relatório publicado pelo Ibama, em 2009. Se as Licenças de Operação necessárias para a venda de energia forem liberadas antes do cumprimento das condicionantes, a sociedade não terá mais como cobrar a aplicação dos recursos previstos para mitigar os impactos sociais e ambientais das usinas”, alerta o sociólogo.
Novoa ressalta que há necessidade de rever os critérios de licenciamento de obras estruturantes que fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “O rio Madeira está sendo utilizado como uma linha de montagem de grandes projetos de infraestrutura programados para a Amazônia, a exemplo da UHE de Belo Monte. Estes empreendimentos atendem a interesses de segmentos econômicos – fábricas de celulose, alumínio e metalúrgica – que precisam de energia barata para competir no mercado internacional, mas que não são grandes geradores de empregos. Já as obras previstas no PAC só geram emprego e renda por um período determinado”.
Sobre os aspectos positivos trazidos pelos grandes empreendimentos – que servem de alavancas para as economias locais, Novoa acredita que os bônus dos mesmos, no chamado período pós-usina, vai depender da habilidade dos futuros administradores públicos para utilizar os fatores de potencialidade da economia que serão deixados pelas obras.
Serviço
A programação do encontro nacional “O Impacto das Grandes Obras e a Violação de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes – Desafios para Prevenção da Violência Sexual” terá continuidade nos dias 23 e 24 de agosto no Aquárius Selva Hotel, com Assembleia Geral do Comitê Nacional de Enfrentamento a Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes.